Te vejo a noite...

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domingo, 24 de abril de 2011

As tormentas da natureza e as da alma açoitam ao planeta...


Profano.
Mia Hertz.

Orion, 22 de abril de 4503.

“A pessoa certa e preparada para levar a cabo a esta missão é Artemisa”! Zeus argumenta impaciente para Afrodite.
- Zeus, será que tem realmente necessidade de tudo isso? Deixe nas mãos de Eros, que ele resolverá. – Afrodite.
-Sabe qual é o seu problema Afrodite, tu pensas que tudo se resolve através do amor, eu já te disse filha, que as coisas nem sempre são assim... – Zeus.”

Gazeta de Orion:
“... A caridade e a justiça dos Deuses, é um tormento para todos os seres, questiono-me se realmente não seriamos mais felizes sem eles...
Como poderemos ter a tão sonhada justiça, se somos meros brinquedos de Deuses passionais com sentimentos tão humanos... ” Levi, o sábio.
"... As tormentas da natureza e da alma açoitam aqueles que procuram a redenção, mas nem sempre a justiça é tão justa, especialmente quando se trata de Deuses com sentimentos tão humanos, quanto os Olímpicos... Nem sempre os seres são totalmente ruins ou totalmente bons... São apenas seres vuneraveis e atormentados..  Elish, anjo negro do quarto planeta de Orion. "

Era uma noite típica de verão úmida e abafada, prenunciando a vinda de uma tempestade.
Numa clareira próxima uma velha árvore chamava atenção pelo seu tamanho e imponência.
Em seu galhos esqueletos balançavam e chocalhavam como se fossem enfeites natalinos macabros.
Ao redor dela a beladona crescia e vicejava a custa da ureia dos condenados que eram enforcados no local.
No solo, a metros de profundidade, uma mulher placidamente dormia em seu sono secular.
Alva como os raios lunares, os seus cabelos cobriam ao corpo nu igual a uma mortalha fúnebre.
Possuía traços delicados quase angelicais, se não fosse pela maldade que transpirava pela sua pele.
Seus braços encontravam-se algemados por grossas correntes de prata ungidas que estavam fincadas nas espessas raízes.
No silêncio noturno, o único som que se escutava a milhas e milhas de distância era o farfalhar das folhas e chocalhar dos esqueletos que balançavam um contra o outro ao sabor do vento.
Grossas e espessas gotas de chuvas caiam lentamente do céu, lavando e limpando tudo ao seu redor, para momentos depois acelerarem e despencarem como se o mundo estivesse para  acabar a qualquer momento.
Raios riscavam aos céus, caindo aleatoriamente e destruindo o que estivesse ao seu alcance.
Trovões estalavam assustando aos incautos animais e aos humanos mais próximos, fazendo com que os mesmos procurassem abrigos e escapassem da fúria dos Deuses.
Nesse momento um raio cruza o céu e atinge a velha árvore, dividindo-a ao meio, destruindo-a e partindo as algemas que prendiam o ser em seu interior.
Ela fora acordada por uma carga altíssima de energia, ainda sentia a eletricidade percorrer seu corpo.
Abrindo lentamente as pálpebras, tentando se livrar da dureza que toma conta dos seus músculos, devido ao longo tempo presa.
Sendo assaltada por antigas lembranças, sente o coração bater intensamente enquanto se deixa levar por sentimentos de ira, frustração e fome.
Ah! Essa eterna e constante fome pela perfumada e macia carne humana, sente a saliva aumentar em sua boca quando se lembra do gosto da tenra iguaria sendo mastigada entre seus lábios.
Ela era um antigo anjo que fora expulsa e banida para esse planeta, a milhões de anos atrás.
Vivera entre deuses, demônios, mutantes, humanos e humanóides.
Quando houve a primeira guerra contra os grandes deuses, lutara ao lado dos filhos de Eva, mas fora traída por aqueles que deveriam ter sido os seus aliados.
Após passar séculos presa no submundo, fora perdoada por Hades e conseguira voltar ao mundo exterior.
Com o coração tomado pela vingança e pelo ódio, se tornara o flagelo dos seres humanos.
Destruíra vilas inteiras, não poupando ninguém. Todos aqueles que cruzaram ao seu caminho sentira o fio da sua espada e o dilacerar dos seus caninos.
Banqueteou-se com os seus antigos aliados e inimigos, eles foram a entrada, o prato principal e a sobremesa.
Fora literalmente uma orgia gastronómica, nunca se divertira tanto quanto nessa época.
Amava ouvir os lamentos, as súplicas e os berros de suas vitimas, era uma sinfonia abençoada, isso sem falar no rio de sangue que deslizava solo abaixo, tornando-o carmim.
No entanto, os Deuses ficaram a par de suas extravagancias sangrentas e não gostara nem um pouco do oceano sangrento que banhava ao planeta.
Reuniram-se sob o comando de Zeus e a perseguiram até encontra-la, prendendo-a com as algemas ungidas e fora acorrentada no solo sagrado de Hera.
Fora séculos e séculos na eterna escuridão, presa, esfomeada e com um ódio mortal por todos e tudo que respirasse.
Finalmente liberta por um golpe do destino e quem sabe das Parcas, ou mesmo dos próprios deuses, quem sabe?
Estava faminta e temerosa de ser aprisionada novamente. Cautelosamente se afasta da clareira em rumo à cadeia de montanha da zona Oeste.
Um local inóspito, onde poucos sobrevivem.
Estava cansada de lutar, de matar, de odiar e de querer vingança a todo custo, já não via mais sentido nesses sentimentos que foram alimentados diariamente por séculos.
Só desejava um local, onde pudesse viver só e liberta, onde não fosse marionete nem de Deuses ou de homens. Queria ser apenas ela.
Andando tropegamente parti em busca de um lugar a qual possa se abrigar.
A tempestade lava o seu corpo, retirando as sujeiras que acumularam com o passar dos anos e limpando também a sua alma.
Já tinha andado uns vinte km, quando se depara com um humano vindo ao seu encontro.
Os seus caninos teimam em expandir gengivas a fora, suas garras ameaçam se projetar pelas unhas.
Controlando todas as mudanças, ela vai se afastando do mortal.
Mas nesse instante, sente ser agarrada por alguém, quando se vira dá de encontro com um ser minúsculo, que expande luzes por todos os seus poros.
Uma criança, no entanto,  se percebe que não era um infante humano.
Temerosa tenta se afastar dela. Entretanto a criatura se aproxima mais, tentando fugir para a sua esquerda, tem o seu caminho barrado pelo o homem.
Presa entre os dois se prepara para lutar contra ambos.
Quando sente uma flecha perfurar ao seu peito.
Procurando a origem da mesma, vê que partiu da criatura luminosa, dando conta que a mesma possuía asas.
- Oh! Deus! Era o cupido que estava à sua frente.
Tentando se afastar as cegas, dá de encontro com algo solido e quente, acolhedor.
Ao abrir os olhos, vê a sua frente ao homem.
Tomada por um sentimento nunca sentido antes, que envolve e preenche ao seu ser com alegria, tristeza, insegurança, acolhimento, carência e como se finalmente tivesse encontrado uma parte sua a muito esquecida e perdida.
Suando frio, coração descompassado, arrepios de prazer e ofegante ao ver o mancebo a sua frente, suas pupilas se dilatam e fica tremula.
Percebe um calor estranho percorrer o seu gélido corpo, aquecendo a sua alma e ao seu ser.
Esquecida de tudo e de todos, olha embevecida ao ser a sua frente como se bebesse da imagem, sendo correspondida pelo mesmo.
Andando em direção a ele, se aproxima; abraça carinhosamente sentindo o calor dele fluindo para o seu corpo, lentamente aproxima os seus lábios virgens da boca masculina.
Sendo beijada profundamente, se entrega e se deixa levar pelo sabor da boca, do aroma almiscarado e da sensação prazerosa que percorre a todo o seu corpo.
Perdida nesse universo de sensações desconhecidas se entrega pela primeira vez, deixando surgir toda a sua vulnerabilidade e temores.
Apertada de encontro a ele, aconchegada no peito masculino ela se deixa levar e ser envolvida pelos braços dele...
Metros de distância dali, uma mulher de armadura e uma criança observam aos amantes.
Artemisa vendo e com um prazer quase doentio, arma o arco com a sua flecha, fazendo pontaria, atira.
A flecha corta o ar e no seu trajeto zune, como se fosse uma abelha em voo, seria interessante se não fosse medonho o barulho que ecoa pelo descampado.
Um som macabro anunciando desgraças e lágrimas...
A flecha vara aos amantes, perfurando-os e unindo-os pelo os corações.
Surpreendidos e surpresos se olham com um misto de dor, de amor, reconhecimento e saudade.
Ela sussurrar ofegante:
Sentir...
Insensato.
Sentidos...
Desacatados.
Sentimentos...
Desenfreados.
Sempre são e serão.
A salvação ou a perdição do homem.
Pois,
Ao se entregarem a eles,
O ser perde a sua paz ou finalmente a encontra?
Eis o dilema!
Que atormenta a alma daqueles que ousam sentir...
Desenfreadamente e plenamente os sentimentos.
Beijando pela última vez o seu amado, morre entre os braços dele e sendo expectadora do seu óbito, caindo abraçados e tombando na relva verde, a primeira e última alcova de ambos.
Artemisa observando a tudo, fala para Eros:
- Bom trabalho! Você já pensou o perigo que ela representaria para os seres?
- Ela sem está amando é cruel, imagine apaixonada, será um demônio incontrolável! Uma víbora a menos em Orion.
Eros, penalizado pelo casal, responde:
-Artemisa, realmente precisava exterminá-los? Ela estava querendo fugir, sinto que estava redimida e só queria sobreviver...
Eros aprenda uma coisa, os Deuses sempre estão certos...-  Artemisa, apontando para o casal, continua: Eles são apenas marionetes descartáveis para o nosso bel prazer.
Uma lágrima discreta desliza lentamente pelo rosto de Eros, ao vislumbrar pela ultima vez aos amantes.



Conto: Mia Hertz.
Poema:  Se Permitir... Mia Hertz.

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